quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Jesus foi ao inferno?



 Desafio bíblico Betel 2014
Fabiana de Oliveira Ribeiro - Alterosa MG

Descensus?
É necessário, a princípio, esclarecer que a expressão "desceu ao Hades" se referindo a Cristo não é encontrada em nenhum lugar das escrituras, embora seja afirmado que ele desceu a  regiões inferiores(Ef 4.9) e  tenha aparecido em dois credos da igreja cristã, o Credo Apostólico(desceu ao Hades) e o Credo de Atanásio(regiões inferiores). Este é um tema teologicamente conflitante que causou divergências até entre grupos análogos como por exemplo os adeptos da reforma radical que viam o descensus sob três perspectivas escandalosamente diferentes. Assim verifiquemos o pensamento de alguns grupos:
A grosso modo, segundo a tradição católica e até Anglicana, Jesus teria descido ao limbus patrum ou Seio de Abraão, lugar intermediário entre céu e inferno(como se isso existisse), para conceder às almas dos santos do Antigo Testamento os benefícios de seu sacrifício expiratório. Para os crentes nessa teoria, Jesus desceu ao setor do Hades onde estavam os bons e não teve contato com os ímpios. Essa ideia tornou-se popular na idade Media,  bom lembrar que se tratava da Era da Trevas.
Lutero, por sua vez, afirmava que a descida de Cristo ao Hades fora realizada  com o propósito de levar cativo o cativeiro, e que é a primeira manifestação vitoriosa do Senhor, mas esse "triunfo" torna-se difícil de ser crido, pois Cristo ainda não havia manifestado sua vitória e, além do mais, Lutero ora fala do assunto por termos metafóricos, ora por literais, não sendo precisamente claro.
Já para os arminianos, Jesus desceu ao Hades com a finalidade de ceder uma segunda oportunidade àqueles que se encontravam lá, seja por que não tiveram oportunidade de conhecer a verdade em vida ou por terem muitos piedosos morrido antes do sacrifício que Jesus teria feito por todos os homens. Essa visão nasce da equivocada interpretação de 1 Pedro 3:18 a 20, eles afirmam que o evangelho foi pregado aos espíritos na prisão do Hades, mas ignoram que os santos do Antigo Testamento já haviam crido no Messias e estavam justificados(Rm 4:3; Gl 3. 6 a 9) o que torna desnecessária essa evangelização. Na mesma carta, Pedro afirma a natureza ilimitada, cheia de poder de Cristo e que estava presente nos pregadores e profetas dos tempos antigos(1Pe 1.11).
Todavia, para a visão reformada, liderada por Calvino, Jesus viveu a experiência das dores do inferno na alma, enquanto estava pregado na cruz. Sentiu todo o peso da ira divina em lugar dos seres humanos, o que se traduz no abandono de Deus. Com respeito a 1 Pedro 3:18 a 20, acredita-se que os espíritos em prisão, contemporâneos a  Noé tiveram sua oportunidade pela pregação de Cristo através do próprio Noé, enquanto fazia a arca. Contudo, foram endurecidos suficientemente, ao ponto de Deus não precisar abrir uma nova oportunidade, no Hades.
Desta forma, crer  nesse evangelismo no inferno é tão fantasioso quanto crer que os apóstolos também ali desceram, como achava Clemente de Alexandria. Não se pode distorcer as verdades bíblicas em prol das almas perdidas. Quando Jesus morreu, entregou seu espírito ao Pai(Luc 23.46); do mesmo modo afirma ao ladrão: "hoje mesmo estarás comigo no paraíso"; também exclamou: "está consumado"(Jo 19.30). Ele não precisaria ir ao inferno completar sua obra de redenção, seu sacrifício na cruz é suficientemente poderoso. Por isso, Jesus esteve com o Pai durante os três dias que antecederam sua ressurreição. Portanto o foco desse assunto deve ser o ensino das escrituras, não a afirmação credal.

REFERÊNCIAS
CAMPOS, Heber Carlos. Descendit ad inferna: Uma análise da expressão"desceu ao Hades" no cristianismo histórico. Fides Reformata, 1999.